Debaixo do chuveiro, com toda aquela água caindo como uma carícia,
um sorriso surgiu assim aflito no meu semblante.
De repente vi que era bom ter um chuveiro de onde a água caísse ao
abrir uma torneira, e ao abrir duas as águas se unissem para se entenderem antes de chegarem ao meu corpo.
E que eu tivesse o controle disso, deixava-me uma sensação de onipresença que me levava ao já citado gesto de sorrir feito boba.
E sorrindo ainda, os olhos fechados para melhor sentir-me, esticava a mão para o sabonete, achando bom ter um sabonete à mão, o xampu, a escova para as costas, tudo ali a me gratificar o momento único, eu me dando conta de que ter um chuveiro era ser o orquestrador de uma chuva excepcional, um emulador de São Pedro.
Enquanto durava esse momento de fuga de tudo que não fosse água ou umidade, de tudo que se aproximasse à secura áspera do verão, dentro de mim um canto se fazia, um canto querendo se acompassar ao repicar da água, em harmônico dueto.
Uma cortina servia de anteparo entre a sofreguidão do corpo e a placidez dos objetos lá fora, em servidão.
Tirzar Ribeiro, escritora, nasceu em Ribeirão Preto – SP.
Entrelinhas / aBrace Editora / Uruguay
Quando eu estou quietinha, meio sem palavras, o mundo conspira e...recebo este texto!
ResponderExcluirObrigada tio, obrigada Tirzar